STJ: Réu Condenado por Tráfico Privilegiado pode ter direito a ANPP – Entenda a decisão
- Douglas Coutinho
- 7 de mar.
- 4 min de leitura
STJ Determina que Ministério Público deve reavaliar ANPP em casos de Tráfico Privilegiado
O direito penal brasileiro, com suas complexidades e nuances, exige do operador jurídico uma constante atenção às mudanças legislativas e às orientações da jurisprudência. Recentemente, a decisão em análise traz à tona questões importantes relacionadas ao Tráfico de Drogas Privilegiado, previsto no artigo 33, §4º, da Lei 11.343/2006, e a aplicabilidade do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), introduzido pelo pacote anticrime, no artigo 28-A do Código de Processo Penal. Esta decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) oferece um ponto de reflexão sobre o excesso de acusação, a necessidade de intimação do Ministério Público e o impacto das alterações nas possibilidades de defesa do réu.
A análise crítica a seguir visa fornecer uma compreensão aprofundada para jovens advogados criminalistas, trazendo a relevância prática da decisão.
Compreensão da Decisão
O caso em exame trata de um agravo regimental interposto contra a decisão que não conheceu de habeas corpus impetrado em favor de uma ré condenada por tráfico de drogas.
A acusada foi inicialmente denunciada pelo artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006, mas, na sentença, foi aplicada a causa de diminuição de pena prevista no §4º do mesmo artigo, configurando o tráfico privilegiado.
O que gerou a controvérsia foi a necessidade de oportunizar ao Ministério Público a proposta do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) após a desclassificação do tráfico para privilegiado.
No julgamento, o STJ decidiu que, uma vez reconhecida a causa de diminuição de pena do tráfico privilegiado, deve ser oportunizado ao Ministério Público analisar a viabilidade de um ANPP. Isso se fundamenta no princípio do “excesso de acusação” (overcharging), que é a situação em que a acusação é mais gravosa do que a conduta efetivamente praticada pelo réu, prejudicando suas chances de uma defesa mais favorável.
Análise Crítica
A decisão do STJ se alinha a um entendimento da Corte, que busca garantir que os réus não sejam penalizados por um excesso de acusação, isto é, por uma imputação que vai além do que os fatos realmente configuram. O artigo 33, §4º, da Lei 11.343/2006 prevê uma redução de pena para aqueles que praticam o tráfico de drogas em menor quantidade ou de forma menos grave, o que justifica a aplicação do tráfico privilegiado.
Quando há essa redução da pena para abaixo de 4 anos, surge a possibilidade de oferecimento do ANPP, o que não pode ser negligenciado.
Este entendimento é crucial, pois o ANPP é um mecanismo de despenalização que visa agilizar a resolução dos casos, permitindo ao réu o reconhecimento de sua infração sem a necessidade de um processo penal completo.
O fato de o Ministério Público não ter sido intimado para oferecer o ANPP no caso concreto configura um erro processual que prejudica o acusado, uma vez que a desclassificação para o tráfico privilegiado abre a porta para essa alternativa.
Importância para os Jovens Advogados Criminalistas
Para os jovens advogados, a decisão é relevante por diversas razões. Primeiramente, ela destaca a importância de se atentar ao conceito de excesso de acusação, que é uma das defesas possíveis em casos de tráfico de drogas. Muitos advogados podem se deparar com casos onde, embora o acusado seja formalmente denunciado pelo tráfico de drogas na modalidade mais grave, a análise da conduta revela que se trata de um tráfico privilegiado. Nessas situações, a aplicação do ANPP pode ser uma estratégia de defesa extremamente eficaz, permitindo ao réu uma solução mais célere e com menor estigma.
Além disso, a decisão reforça a necessidade de vigilância quanto ao papel do Ministério Público na fase pré-processual e sua relação com o oferecimento de acordo de não persecução penal. Ao assegurar que, após a desclassificação do tráfico para privilegiado, o Ministério Público deve ser intimado a avaliar o ANPP, o STJ também reforça a ideia de que o processo penal não pode ser conduzido de forma punitiva além do necessário, respeitando os princípios da proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana.
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. TRÁFICO DE DROGAS PRIVILEGIADO. ART. 33, §4º, DA LEI 11.343/2006. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL (ANPP). EXCESSO DE ACUSAÇÃO. NECESSIDADE DE INTIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. AGRAVO PROVIDO PARA CONCEDER A ORDEM. I. CASO EM EXAME
1. Agravo regimental interposto contra decisão que não conheceu de habeas corpus impetrado em favor de paciente condenada por tráfico de drogas, com aplicação da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006. A defesa sustenta que, com a desclassificação para o tráfico privilegiado, deveria ser oportunizado ao Ministério Público o oferecimento de acordo de não persecução penal (ANPP), conforme o art. 28-A do Código de Processo Penal. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. A questão em discussão consiste em verificar se, após o reconhecimento da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006, deve ser oportunizado ao Ministério Público o oferecimento de acordo de não persecução penal, em face do excesso de acusação. III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A jurisprudência das Turmas do STJ tem reconhecido a necessidade de retorno dos autos à origem, para oportunizar a proposta de ANPP, quando há desclassificação para o tráfico privilegiado, pois o excesso de acusação (overcharging) não deve prejudicar o acusado.
4. No caso, a paciente foi inicialmente denunciada por tráfico de drogas (art. 33, caput), mas, na sentença, foi aplicada a minorante do tráfico privilegiado, reduzindo a pena abaixo de 4 anos, o que permite a análise da possibilidade de oferecimento de ANPP, conforme o art. 28-A do CPP.
5. Diante do reconhecimento do tráfico privilegiado, faz-se necessário o retorno dos autos à origem para que o Ministério Público analise a viabilidade do ANPP, em consonância com precedentes desta Corte.
IV. AGRAVO REGIMENTAL PROVIDO.
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